Especialistas analisam parcerias público-privadas na regulação de alimentos

A obesidade é considerada um dos principais fatores de risco no aumento alarmante de doenças crônicas não transmissíveis no mundo, que, segundo a OMS, mataram mais de 36 milhões de pessoas só em 2008. Por isso, a regulação da indústria de alimentos vem sendo discutida globalmente e foi tema da Reunião de Alto Nível da ONU, realizada em Nova York, em setembro do ano passado.

Recentemente o UNSCN (United Nations Standing Committee on Nutrition) lançou uma publicação com artigos sobre como o mercado pode atuar em conjunto com os governos para combater o problema. Corinna Hawkes, pesquisadora e consultora da OMS para regulação da área de alimentos, e Kent Buse, consultor da UNAIDS, assinaram um texto sobre parcerias público-privadas que vêm sendo implementadas por diversos países, a exemplo dos acordos de redução de sódio.

Os autores chamam a atenção para um ponto crucial no êxito desses acordos. Para eles, é possível fazer parcerias bem sucedidas, contanto que se avaliem os riscos embutidos nisso – o mais importante deles é o conflito de interesses.

De acordo com Hawkes e Buse, está claro que é preciso regular uma série de questões relacionadas à indústria de alimentos. Só para pontuar alguns exemplos, vale citar a promoção de campanhas em prol da saúde e da alimentação saudável, o fortalecimento da educação de hábitos alimentares, a elaboração de diretrizes e, claro, a regulação da publicidade e de ações de marketing de produtos alimentícios.

Os dois últimos pontos encontram uma resistência fortíssima do mercado, tanto no Brasil como em outras nações, pois atingem diretamente os interesses da indústria. Nesse sentido, o artigo alerta para a necessidade de esclarecer o papel do Estado e do mercado nesse processo.

Hawkes e Buse apontam para algo que parece óbvio, mas que vem sendo esquecido em muitas dessas parcerias público-privadas. Eles reforçam que há uma diferença fundamental entre a atuação pública e a privada: o setor privado tem como principal objetivo gerar lucro, enquanto o setor público tem a obrigação de proteger os cidadãos. “Isso não quer dizer que o setor privado não tenha uma função pública”, lembram os autores, citando que a garantia à saúde e à alimentação está quase sempre baseada nas atividades da indústria, que produz e distribui os alimentos. Mas “setores da indústria de alimentos também produzem e anunciam produtos que são prejudiciais diante da perspectiva da alimentação saudável”. E mais uma vez surge a questão do marketing de alimentos…

O problema da obesidade e dos altos índices de doenças crônicas não transmissíveis só será vencido com um conjunto de ações amplas, que contemple desde a questão da educação até a reformulação de produtos (com redução de sódio, açúcar e gorduras) e a regulação de publicidade. Não haverá sucesso apenas com metade dos esforços.

O texto de Hawkes e Buse sugere que a OMS elabore parâmetros para que setores públicos e privados possam formar políticas e programas que de fato sejam eficazes nesse contexto. Vale a pena ler 

Para saber mais:
Diretrizes da OMS para reduzir o impacto do marketing de alimentos e bebidas com baixo teor nutricional.
 
Entrevista de Corinna Hawkes para o Projeto Criança e Consumo, do Instituto Alana.