Publicitários, executivos da indústria de saúde e representantes de empresas de comunicação encheram o auditório do Hotel Sheraton, em São Paulo, na última sexta-feira, 18 de novembro. Estavam todos lá para prestigiar o lançamento da campanha “O futuro promete. Eu quero chegar bem lá”, uma inciativa da Abap (Associação Brasileira das Agências de Publicidade) e da AMB (Associação Médica Brasileira), com apoio de diversas entidades e empresas ligadas ou ao mercado publicitário e anunciante ou à indústria da saúde.
Ausente na 4ª Conferência de Segurança Alimentar e Nutricional, realizada uma semana antes em Salvador, o ministro Alexandre Padilha marcou presença no evento e teceu muitos elogios ao setor privado. “Acredito que a agenda positiva pode fazer muito mais do que a agenda de conflito ou divergência”, declarou. Segundo ele, campanhas educativas contribuem muito rapidamente para a redução dos problemas de saúde.
Sem dúvida a consciência é uma ferramenta poderosíssima para o cidadão reivindicar a proteção de seus direitos. Por isso mesmo, o Projeto Criança e Consumo, desde 2006, engajou-se no debate sobre como reduzir o problema da obesidade infantil no Brasil e apoiou a construção de políticas públicas de extrema relevância para o combate ao problema.
Um bom exemplo dessas políticas é a Resolução nº 24 da Anvisa, que prevê a inclusão de alertas nas campanhas de publicidade de alimentos com alto teor de açúcar, gorduras e sódio e de bebidas de baixo valor nutricional sobre os riscos do consumo excessivo desses produtos. Isso é informação.
No entanto, a Resolução da Anvisa se encontra suspensa por liminar na Justiça Federal, depois de ser totalmente rejeitada pelo mercado – que, vale lembrar, participou de todo o processo absolutamente democrático da Consulta Pública nº 71 e, ao fim do debate, resolveu questionar a legitimidade da Anvisa para regular a questão.
Ao contrário do que se faz querer pensar, o diálogo entre setor privado, Estado e organizações de defesa do consumidor é muito mais comprometido pela intransigência do mercado, que na hora de negociar ações que beneficiam o cidadão brasileiro não abre mão de seus próprios interesses.
Presidente da Abap, o publicitário Luiz Lara disse durante o evento do Sheraton: “É preciso usar a propaganda de forma responsável. É preciso viver bem e melhor”. Concordamos plenamente. No entanto, não vemos um avanço real nesse sentido. Lança-se uma campanha como essa, que joga nas costas do consumidor toda a responsabilidade de mudar seus hábitos cotidianos, mas o bombardeio de comunicação de mercado de alimentos não-saudáveis continua e muitas vezes é direcionado ao público mais vulnerável, o infantil.
Iniciativas como a campanha “O futuro promete” são importantes e contribuem para uma vida mais saudável. Mas de nada adiantam se no intervalo do desenho animado há publicidades de salgadinhos e bolachas recheadas. Se a fabricante de guloseimas investe num site infantil para atrair a atenção dos pequenos. Se, para vender o lanche, cria-se brindes colecionáveis e estimula-se o consumo excessivo e frequente de produtos que estão longe de ser adequados para uma dieta equilibrada.
O futuro promete sim. Mas só chegaremos bem lá se houver de fato um comprometimento do setor privado, do Estado e da sociedade com a saúde e o bem-estar.
Para reler: em janeiro, a coordenadora geral do Projeto Criança e Consumo, escreveu um post neste blog sobre a importância de ações amplas de combate à obesidade. Esse vale a pena relembrar.